Os inevitáveis ventos frios



Estava só, mas tão satisfeito consigo mesmo que o movimento não o incomodava. Seus pensamentos e toda sua vida eram um banquete que  satisfaziam melhor que qualquer coisa, tudo tão fácil e rápido ou seu dinheiro de volta...
Uma tarde pueril em uma vida insípida. Sentado lendo um folheto qualquer, pairando nas folhas secas de alguma entidade indigente do outono.
 Ergueu a cabeça, uma revoada de pássaros, algo começara a acontecer nas raízes das gramíneas. As arvores começaram a mexer-se convulsivamente rebelando-se contra leis naturais, e de arvore para arvore aquele caos ia irradiando alastrando-se para todo o espaço. Nuvens de poeira ebuliram do solo seco e toda essa dúvida o atingiu. Arrancaram os papéis que ele tinha em mãos, vento frio queria seu trono na tarde morna. Soprou a calma, o silêncio, o passarinho inocente que caçava o inseto inocente. Vento frio insensível, vento frio indomável, tirano das tarde desse pré-inverno. Rompeu a barreira da derme e da razão, fazendo morada no corpo daquele homem, que, de pé, à beira do abismo  perguntou altivo: “Quem se atreve?!” E ao ouvir a própria voz se deu conta de quão baixa ela era, e de quão grande era sua arrogância. O vento deu uma única resposta à pergunta feita. Veio uivando glacialmente do coração do abismo e o arrebatou com um golpe violento de vento.
Viu-se subitamente nu, sem certezas, sem opiniões ou emoções. Toda essa velocidade, essa conectividade não fazia mais sentido. Roubaram-lhe todo um pedaço do espírito. Agora não estava mais só, estava também sozinho. Não existiam mais pilares, não existia mais poesia. Tinha medo de julgar, de se julgar, talvez não soubesse mais. Talvez nunca tivesse realmente sabido.
Agora o banquete apodrecera, o dinheiro devolvido era podre e os pássaros haviam voado para longe.
A natureza não precisa de palavras, apenas de invernos e ventos frios.


Sempre seus: Vito Julião de Azevedo

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